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20 05 Microbiologia PosGraduacao proftransMeu nome é Fernando Luz de Castro, sou um homem transexual, tenho 30 anos, sou biólogo de formação e hoje ocupo cargo de professor substituto no Instituto de Microbiologia Paulo de Goes, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). De acordo com minha trajetória acadêmica, me encontro vinculado ao Departamento de Virologia da presente instituição, tendo, durante o contrato atual, a incubência de ministrar aulas para os cursos de Enfermagem, Odontologia e, mais recentemente, Biologia.

Nasci em Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul, onde fiz meu mestrado com enfoque na área de Virologia Veterinária, na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Contudo, meu amor pela área da saúde me moveu a buscar oportunidades de crescimento fora de minha zona de conforto e, deste modo, me vi obrigado a me afastar de meus familiares e temporariamente de minha ex namorada Isabel (hoje grandiosa amiga e companheira de caminhada). Aventurei-me a buscar crescimento no Rio de Janeiro, que de início mostrou-se uma cidade tão maravilhosa quanto intimidadora, uma vez que não conhecia praticamente nada nem ninguém exceto uma querida amiga gaúcha que me auxiliou na abertura de portas para o doutorado, no Programa de Pós-Graduação em Genética da UFRJ, especificamente junto ao Laboratório de Virologia Molecular, coordenado pela imponente figura do Prof. Dr. Amilcar Tanuri.

Todavia, nesta fase em específico de minha vida não travava apenas uma batalha acerca de minhas aspirações profissionais, mas intensa luta mental, uma vez que tal período coincidiu com o início do renascimento do meu eu. A realização da transexualidade não se tratou de evento fácil e nem simples, como creio que nunca tenha sido à qualquer membro de minha comunidade devido ao enorme estigma carregado e opressão intensiva em uma sociedade ainda profundamente ignorante a nosso respeito.

Como sempre me senti diferente, mesmo antes de me compreender por inteiro, fiz uso da sabedoria do psicólogo e escritor transexual João Nery, que, em seu livro Viagem Solitária, reflete acerca da necessidade de se armar com a intelectualidade diante de nossa condição nesta sociedade. Sendo assim, optei por manter em sigilo toda minha descoberta, vivendo meu profissional completamente a parte disto tudo até alcançar determinado patamar antes que aquilo que tomava forma dentro de mim de fato viesse a tona por completo. Obviamente, os dias passavam-se diante de grande opressão mental, tendo acalento no divã de minha terapeuta, no carinho de minha ex companheira, e nas palavras dos amigos. Minha família demorou-se um pouco a absorver a ideia, mas tratou-se também de um apoio fundamental mais adiante nisto tudo. Sob os ombros destas pessoas suportei a prisão de mim mesmo muitas vezes diante de momentos de transfobia observados em plena comunidade acadêmica, um ambiente onde a luz da razão e clareza de pensamento deveriam habitar em maior intensidade. Todavia sabe-se, que mesmo diante da coletividade, as sombras da ignorância muitas vezes tratam-se de algo profundamente enraizado no individual de cada um.

Concluí meu doutorado ao apresentar com muita felicidade minha pesquisa acerca da modulação da expressão gênica causada pela infecção do vírus Zika, na época uma importante epidemia que assolava o país. Ao longo de todo este período, prestei três concursos para professor substituto na presente instituição, tendo passado no primeiro e ocupado cargo junto ao Departamento de Genética, e no terceiro, ocupando a vaga na qual me encontro hoje. Após ocupar também posição de pós-doutorando no mesmo laboratório, com muito suporte de minha atual companheira Alexandra e novamente de minha terapeuta Flávia, senti firmeza em mim e segurança em finalmente sair do casulo. Vencendo o medo aterrador da invalidação e da transfobia, exprimi a verdade libertadora que tocou o coração de meus colegas, encontrando tanto em meu laboratório quanto no Departamento de Virologia dois ambientes extremamente acolhedores.

Ressalto aqui algumas figuras queridas neste momento, como meu ex orientador e hoje colaborador Prof. Dr. Renato Santana de Aguiar, ao qual primeiramente me expus e deu todo suporte diante do laboratório. Também a querida colega de laboratório, Profa. Dra. Luiza Higa, que me abraçou diante de minha exposição adiantando-se logo em trocar meu nome onde quer que encontra-se, fosse em documentos, listas ou avisos no laboratório, sem eu nem mesmo ter pedido por isto. De coração também destaco o secretário do Departamento de Virologia, Ramón, que prontamente me apoiou no ato de informar ao corpo docente minha condição, e, por fim, a estimada colega Profa. Dra. Juliana Cortines, que me convidou e motivou a escrever esta biografia. Com este texto, tenho intuito de mostrar que sim, é possível! Não apenas possível, como merecido a muitos de nós, pessoas transexuais, que, almejando ocupar um lugar na academia travam não apenas suas batalhas profissionais, porém sangram ainda todos os dias em suas batalhas íntimas pessoais.

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