Logo do Site

Por Matheus Fernandes Werner
Matéria escrita na disciplina de extensão de integração acadêmica do Curso de Bacharelado em Ciências Biológicas: Microbiologia e Imunologia

soldadinhos.fwEm um tempo finito no passado, ocorreu uma grande explosão chamada “Big Bang”, que proporcionou o desenvolvimento inicial do universo. Estima-se que o planeta Terra tenha cerca de 4,5 bilhões de anos e que a origem da vida se deu há 3,5 bilhões de anos atrás, no momento em que o planeta começou a esfriar, formando uma crosta terrestre. A vida na Terra começou de maneira microscópica e os organismos vivos foram se adaptando e evoluindo diante de todas as transformações que ocorreram no planeta. Por isso, hoje, desde os organismos mais simples até os mais complexos, eles compartilham características como a capacidade de se reproduzir e gerar hereditariedade. Esta última característica gerou a necessidade de armazenamento dessas informações que são carreadas e, por isso, esses organismos possuem uma organização celular com material genético.

Os microrganismos (organismos vivos microscópicos) foram os primeiros organismos a habitar a Terra. As bactérias estão em um Reino que se ramifica em diferentes gêneros e espécies refletindo a existência de milhares de tipos diferentes que apresentam uma heterogeneidade gigantesca. Por exemplo, algumas conseguem resistir a condições que nós, humanos, não suportaríamos, como as temperaturas superiores a 100°C. Os vírus também possuem uma vasta heterogeneidade e conseguem suportar diferentes condições ambientais dependendo das características de cada espécie. Por exemplo, vírus não envelopados suportam um pH ácido, enquanto que os vírus envelopados não suportam e são mais susceptíveis as condições ambientais.

Os microrganismos são classificados com menor ou maior nível de complexidade de acordo com seu material genético. Entretanto, se considerarmos que esses microrganismos continuam evoluindo e interagindo com outros organismos até hoje, esse tipo de classificação pode ser equivocada. Muitos desses microrganismos interagem com os seres humanos, seja de maneira positiva ou negativa. Os microrganismos que interagem de forma positiva são, por exemplo, os que compõem a chamada microbiota (conjunto de microrganismos associados a tecido). No nosso trato digestivo há diversas bactérias que ajudam na digestão, convertendo substâncias para uma forma na qual o corpo consegue absorver e, sendo assim, existe uma extrema necessidade de contê-las no corpo. Esses microrganismos também podem se associar de forma negativa quando há um desbalanço da homeostasia do corpo humano. Com o desbalanço ficamos doentes, pois pode ocorrer uma interação desses microrganismos com o nosso sistema de defesa, chamado sistema imunológico, também conhecido como o exército de soldadinhos protetores. Somando a resposta do sistema imunológico (que pode variar de individuo para indivíduo), com os microrganismos e outros fatores externos ocorrerá a doença.

Os soldadinhos do sistema imunológico também são heterogêneos: existem diferentes tipos de célula que compõem o sistema imunológico, que também vem evoluindo ao longo do tempo. Há um sistema imunológico mais primitivo, mas não por isso menos importante, chamado sistema imune inato. Esse sistema é composto por diferentes células que são capazes de reconhecer os microrganismos, como os patogênicos. O sistema imune inato reconhece moléculas padrões presentes nas bactérias assim como moléculas padrões de fungos e de demais microrganismos. Essas células são os macrófagos, dendríticas e neutrófilos entre outras. Estas são células mais flácidas, que conseguem abraçar e capturar o patógeno por um mecanismos chamado de fagocitose. Uma vez dentro da célula, eles podem ser digeridos por enzimas provenientes de uma organela. Mas, não somente por essas enzimas, eles podem ser eliminados por outros mecanismos como por espécies reativas de oxigênio (ROS), ou também por outros componentes que possuem características microbicidas. As células conseguem reconhecer esses patógenos através de receptores na sua membrana, chamados receptores de reconhecimento de padrão (PRR), que reconhecem porções dos patógenos que foram conservadas na luz da evolução. Essas porções que são reconhecidas são chamadas de padrões moleculares associadas a patógenos (PAMPs). A ativação dos PRRs pelos PAMPs resulta na ativação das células com produção de mediadores inflamatórios e moléculas microbicidas. A ativação de alguns PRRs pode levar fagocitose e, consequentemente, a eliminação do microrganismo. Entretanto, novamente considerando o contexto de constante evolução a que estão submetidos nas suas interações com seus hospedeiros, sabemos que alguns microrganismos conseguem escapar dos mecanismos microbicidas produzindo enzimas que degradam as proteínas que lhe causariam o dano.

Mais recentemente no processo evolutivo, modificações no material genético levaram a geração de um novo tipo de receptor, mais específico contra pequenas sequencias de aminoácidos chamadas de antígeno, deram origem ao sistema imune adaptativo. Esse sistema, que apareceu pela primeira vez em peixes mandibulados chamados Lampréias, é composto por dois tipos celulares: os linfócitos T e os linfócitos B. Essas células são ativadas por algumas células da imunidade inata através de um evento denominado apresentação de antígenos. O linfócito T, ao reconhecer especificamente um antígeno apresentado pela célula dendrítica numa condição excelente, será ativado e produzirá substâncias que atuam nas células da imunidade inata levando ao aumento na produção de compostos microbicidas, ajudando na resposta imunológica. Por isso, os linfócitos T são considerados células auxiliadoras. Os linfócitos B são os soldados conhecidos como produtores dos anticorpos, que ficam no organismo por longos período de tempo. Em caso de re-infecção pelo mesmo patógeno, eles podem atuar rapidamente. Uma das formas pela qual os anticorpos podem combater um patógeno é através do mecanismo de opsonização. A opsonização consiste na ligação do anticorpo à superfície do patógeno permitindo que células da imunidade inata, ao reconhecer esses anticorpos, realize a fagocitose e elimine o patógeno.

Como vimos, a resposta imune envolve a ativação de muitas células que secretam muitas substâncias que são microbicidas mas podem acabar por lesionar os tecidos do hospedeiro. Com isso, há a necessidade do reparo tecidual. A resolução da inflamação ocorre no final da resposta imune e é realizada por alguns tipos de células, tanto da imunidade inata como da imunidade adaptativa, que são uma subpopulação específica dos macrófagos (chamados de M2) células reguladoras, respectivamente. Essas são células capazes de secretar substâncias que auxiliam na cicatrização, reconstituindo os tecidos lesionados e levando o corpo de volta à uma condição de homeostasia após a batalha contra o patógeno.

A vida dos soldadinhos não é fácil, é uma constante batalha para nos proteger. Mas, existem maneiras de ajudarmos. Com uma boa alimentação, higiene e cuidado, conseguimos ajudar nosso corpo no combate. Uma boa alimentação e um exercício físico são indispensáveis para uma vida melhor, com batalhas menores e com mais tempo para se divertir, brincar e ser feliz!

Fontes:
FLAJNIK, M., & DUPASQUIER, L. (2004). Evolution of innate and adaptive immunity: can we draw a line? Trends in Immunology, 25(12), 640–644. http://doi.org/10.1016/j.it.2004.10.001

Cooper, M. D., & Alder, M. N. (2006). The Evolution of Adaptive Immune Systems.Cell,124(4),815822. http://doi.org/10.1016/j.cell.2006.02.001

Iwasaki, A., & Medzhitov, R. (2015). Control of adaptive immunity by the innate immune system. Nature Immunology, 16(4), 343–353. http://doi.org/10.1038/ni.3123

Martin Flajnik and Masanori Kasahara. (2010). NIH Public Access. Nat Rev Genet, 11(1), 47–59. http://doi.org/10.1038/nrg2703.Origin

Matsunaga, T., & Rahman, A. (1998). What brought the adaptive immune system to vertebrates? - The jaw hypothesis and the seahorse. ImmunologicalReviews,166(2),177186. 
http://doi.org/10.1111/j.1600-065X.1998.tb01262.x

Medzhitov, R. (2008). Origin and physiological roles of inflammation. Nature, 454(7203), 428–435. http://doi.org/10.1038/nature07201

Rinkevich. (1999). Invertebrates versus Vertebrates Innate Immunity: In the Light of Evolution (“Nothing in biology makes sense except in the light of evolution” T. Dobzhansky, Amer Biol Teacher 1973;35:125–9). Scandinavian Journal of Immunology, 50(5), 456–460. http://doi.org/10.1046/j.1365-3083.1999.00626.x

Chaisson, E. J. (2014). The Natural Science Underlying Big History, 2014. http://doi.org/10.1155/2014/384912

Por Vinicius Guimarães Suzart Silva
Matéria escrita na disciplina de extensão de integração acadêmica do Curso de Bacharelado em Ciências Biológicas: Microbiologia e Imunologia.

virus gigantes 2Os pesquisadores Lwoff e Tournier, em meados da década de 1960, criaram o critério discriminativo entre células e vírus. Este critério se baseou em características próprias e singulares da nova forma biológica descrita, isolada pela primeira vez em 1892 pelo cientista Ivanovsky a partir de amostras vegetais afetados pela doença do mosaico do tabaco.

É definido vírus toda estrutura biológica de genoma composto por DNA ou RNA, que não sejam capazes de auto divisão, que não possuam o aparato necessário para tradução de seus próprios RNAs mensageiros e que não sintetizem moléculas de ATP como aporte energético. O tamanho é outra característica associada historicamente aos vírus, pelo fato de essas formas biológicas serem extremamente pequenas, capazes de atravessar poros de filtros esterilizantes de diâmetro 0.2-0.3 µm, e consequentemente, essas estruturas são invisíveis à microscopia óptica. Contudo, essa característica não compõe o critério inicial proposto por Lwoff.

Em 1992, o isolamento de um novo microrganismo intricaram estudiosos no Reino Unido. A fim de investigar a origem de um surto de pneumonia, foram coletadas amostras de água em uma torre de abastecimento da cidade de Bradford. Um microrganismo gram-positivo e visível ao microscópio óptico foi isolado, o que sugeriram ser uma nova espécie de bactéria, a qual passou a ser denominada Bradford coccus.

Mais tarde, em 2003, pesquisas revelaram que a nova “bactéria” possuía um capsídeo icosaédrico (uma característica dos vírus), com 0.5 mm de diâmetro e com um genoma codificando para mais de 1.000 genes. Essa descoberta mostrou que a espécie Bradford coccus, antes relacionada a protista, tem de fato natureza viral 10 anos após ser isolada.

O termo “vírus gigante” passou a ser adotado para denominar vírus facilmente visualizados em microscopia óptica. Após a reclassificação do Bradford coccus por sua identidade viral, novas pesquisas e descobertas foram feitas. Atualmente, há quatro famílias para essa nova categoria de vírus: Mimiviridae, Pithovirus, Mollivirus e Pandoraviridae. Pode-se destacar o fato de que todos os vírus gigantes descritos até o momento infectam espécies de amebas do gênero Acanthamoeba, um dos protozoários mais comuns presentes no solo, ambiente aquático e sistemas de tubulação de água convencionais. A patogenicidade desses vírus ao homem permanece incerta.

No Brasil, duas novas espécies de vírus gigante foram descritas. Um vírus gigante foi isolado em Belo Horizonte e recebeu o nome de Niemeyer, uma homenagem ao famoso arquiteto brasileiro. Isolado a partir de uma amostra de água da Lagoa da Pampulha, o Niemeyer vírus foi classificado como pertencente à família Mimiviridae. Uma espécie nunca antes isolada foi descoberta durante uma expedição científica no norte do país, no estado do Amazonas. Pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais, em parceria com a Universidade de Marseille (França), coletaram amostras de água do Rio Negro, um afluente do Rio Amazonas. Batizado pelos cientistas de Samba, uma homenagem à cultura e identidade brasileira, este vírus possui um capsídeo de diâmetro de 352 nm e fibrilas com 112 nm de comprimento, totalizando um diâmetro completo de 574 nm. O Samba virus é o maior vírus isolado em território brasileiro já descrito até o momento.

Referências:
DORNAS, F.P.; RODRIGUES, F.P; BORATTO, P.V.M.; SILVA, L.C.F.; FERREIRA P.C.P.; BONJARDIM, C.A; TRINDADE, G.S.; KROON, E.G.; SCOLA, B.L.; ABRAHÃO, J.S. Mimivirus Circulation among Wild and Domestic Mammals, Amazon Region, Brazil. Emerging Infectious Diseases 2014, Vol.20, No.3.

ABERGEL, C.; LEGENDRE, M.; CLAVERIE, J-M. The rapidly expanding universe of giant viruses: Mimivirus, Pandoravirus, Pithovirus and Mollivirus. FEMS Microbiology Reviews 2015, fuv037, 39, 779–796.

SHARMA, V.; COLSON, P.; PONTAROTTI, P.; RAOULT, D. Mimivirus inaugurated in the 21st century the beginning of a reclassification of viruses. ScienceDirect 2016, 31:16-24.
DORNAS, F.P.; KHALIL, J.Y.B.; PAGNIER, I.; RAOULT, D.; ABRAHÃO, J.S.; SCOLA, B.L. Isolation of new Brazilian giant viruses from environmental samples using a panel of protozoa. Frontiers in Microbiology 2015, 6:1086.

BORATTO, P.V.M.; ARANTES, T.S.; SILVA, L.C.F.; ASSIS, F.L.; KROON, E.G.; SCOLA, B.L.; ABRAHÃO, J.S. Niemeyer Virus: A New Mimivirus Group A Isolate Harboring a Set of Duplicated Aminoacyl-tRNA Synthetase Genes. Frontiers in Microbiology 2015, 6:1256.

CAMPOS, R.K.; BORATTO, P.V.; ASSIS, F.L.; AGUIAR, E.R.G.R.; SILVA, L.C.F.; ALBARNAZ, J.D.; DORNAS, F.P.; TRINDADE, G.S.; FERREIRA, P.P.; MARQUES, J.T.; ROBERT, C.; RAOULT, D.; KROON, E.G.; SCOLA, B.L.; ABRAHÃO, J.S. Samba vírus: a novel mimivirus from a giant rain forest, the Brazilian Amazon. Virology Journal 2014, 11:95.

ivandrogasPor Ivan Cardoso De Oliveira

Matéria escrita na disciplina de extensão de integração acadêmica do Curso de Bacharelado em Ciências Biológicas: Microbiologia e Imunologia

Periodicamente acompanhamos notícias sobre infecções hospitalares com microrganismos resistentes às terapias convencionais. Frequentemente os veículos de comunicação científica reportam casos de resistência e multirresistência bacteriana, fúngica, protozoária, viral e alguns casos de resistência helmíntica. Por outro lado, a descoberta e aprovação de novas classes de antimicrobianos têm levado décadas. Devido ao fato deste assunto ser relativamente amplo, focar-se-á nossa discussão na resistência bacteriana. Porém, primeiramente devemos abordar o mecanismo de ação dessas drogas e as formas de resistência às mesmas.

A forma de ação dos antibacterianos sejam estes antibióticos (origem biológica), semissintéticos (antibióticos modificados em laboratório) ou sintéticos (integralmente sintetizados em laboratório), baseia-se em poucos mecanismos. O resultado final da atuação destas drogas pode ser a morte do microrganismo ou a sua inativação metabólica. Os compostos que conduzem ao primeiro evento são chamados de bactericidas e os que levam ao segundo são chamados de bacteriostáticos. Quando tratamos da resistência bacteriana a estas drogas, verificamos que componentes biológicos bastante elaborados medeiam o fenômeno.

  • sbctacnpqfaperjcapespetrobrassbm
  • rede de tecnologiafinep 2agencia de inovacaosebraeembrapanpi
  • projeto coralperiodicosCurta Logo Print 2cienciacommicrobios
Topo