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13 07 Microbiologia Variola graduacaoPor Daniela Masid de Brito, Rebeca de Souza Brum, Bruno Marques Vieira, Manuella Lima, Elizabeth Chen Dahab, Kassiane Melo de Oliveira, Renato Nunes Ferreira. Matéria escrita na disciplina de extensão de integração acadêmica do Curso de Bacharelado em Ciências Biológicas: Projeto de extensão: SAÚDE É NOTÍCIA - OFICINA DE REDAÇÃO CIENTÍFICA Divulgação - Crítica - Síntese. Creditação da extensão no Instituto de Microbiologia.

Em 16 de setembro de 2019 o Centro Estadual de Pesquisa de Virologia e Biotecnologia mais conhecido como Instituto Vector localizado em Koltsovo, na Sibéria, sofreu um incêndio.

O acidente ocorreu durante uma inspeção sanitária e a causa teria sido a explosão de um cilindro de gás seguida de incêndio. A explosão não causou danos estruturais ao prédio, contudo deixou um funcionário com queimaduras de terceiro grau.

O Instituto Vector, um dos principais centros de pesquisa do mundo, é responsável pelo desenvolvimento de vacinas e de ferramentas para o diagnóstico e tratamento de doenças infecciosas. Seu repositório contém diversas amostras biológicas de patógenos como os vírus da Ebola, gripe aviária e varíola e, funcionou durante a Guerra Fria como centro de desenvolvimento de armas biológicas. Com o final da Guerra, o Instituto passou a trabalhar com pesquisa e desenvolvimento. Além do Vector, o Centro de Controle de Doenças dos Estados Unidos, também possui amostras biológicas do Vírus da Varíola.

Para tranquilizar o público, as autoridades locais e os responsáveis pelo Instituto relataram que nenhuma amostra contendo material biológico foi atingida, por não estarem na sala onde ocorreu a explosão.

No entanto, o acidente alertou os pesquisadores e os profissionais de saúde para o que poderia ocorrer, caso tivesse sido atingido o local de armazenamento do vírus. A grande questão que o episódio suscita é se este tipo de acidente é capaz de iniciar uma epidemia, ou mesmo uma pandemia. Os dados do problema são discutidos abaixo, para o caso específico da varíola, uma doença temível, com a qual a maior parte da população mundial nunca teve contato, e sobre a qual não se tem informações elementares.

Importância da campanha de vacinação mundial

A varíola é uma doença letal, altamente contagiosa, encontrada exclusivamente em seres humanos, e causada pelo vírus Orthoposxivirus varíolae. Há registros quantitativos de mortes desde o século XVII até a década de 1980, mas a prática da imunização contra a varíola antecede esse período, nos países do Extremo-Oriente, como a China, indicando a importância dessa infecção para a saúde das populações em sociedades pré-industriais.

Tabela: Informações:

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Segundo a Organização Mundial da Saúde, o último registro de paciente com varíola ocorreu em 1977. Devido a intensas campanhas de vacinação, sendo esta extremamente eficaz (apenas uma dose garante imunidade duradoura), com tempo médio de imunização de 10 anos. A erradicação da varíola foi possível porque não há reservatório animal da doença, nem carreadores humanos (sadios ou cronicamente infectados). Assim, quando o último paciente não tem mais a quem passar a infecção porque a comunidade está vacinada, a transmissão se extingue por falta de hospedeiros suscetíveis.

Após a erradicação da doença, não houve mais necessidade de vacinar a população. Com isso as campanhas de vacinação contra varíola estão suspensas desde a década de 80. No Brasil, a campanha de vacinação se encerrou em 1979. Deve-se lembrar de que, em todas as pessoas vacinadas, a memória imunológica desaparece após vários anos, ou seja, quem estava vacinado naquela época, hoje está tão vulnerável quanto as pessoas que nunca foram vacinadas.

Apesar de erradicada, ainda há preocupações com o uso do vírus da Varíola como arma para o bioterrorismo. Uma vez que as pessoas nascidas depois de 1990 não estão imunizadas, permanecendo suscetíveis à ação do vírus.

Atualmente não há remédio contra a Varíola, sendo a vacinação a única maneira de promover uma prevenção eficaz. Uma promissora notícia é que no último ano foi aprovado o primeiro teste para um medicamento, mas esse não pode ser testado em um caso humano de varíola, o que deixa indefinida a sua situação numa emergência real.

A vacinação é o processo de preparo do sistema imune contra um patógeno específico. A vacina contra as doenças virais, como a varíola, contém ou um vírus inativado (um vírus incapaz de infectar o hospedeiro) ou um vírus atenuado (um vírus “enfraquecido” ou semelhante ao original, que gera uma infecção leve ou moderada). Este vírus inativado estimula a produção, no corpo humano, de anticorpos contra o vírus e de células ditas citotóxicas, que matam por contato direto as células infectadas pelo vírus no corpo do hospedeiro - são duas classes distintas de agentes do nosso próprio sistema de proteção contra um agente infeccioso específico, preparando o organismo para responder de forma eficiente contra o patógeno.

Para o caso de doenças contagiosas, a vacina é fundamental para criar uma proteção coletiva. Pessoas que não podem ser vacinadas, como indivíduos imunodeficientes, são protegidas do contágio pela barreira representada pelo conjunto de pessoas próximas (contatos) regularmente vacinadas, e, portanto, incapazes elas mesmas de transmitir a doença.

Por que mantemos estoques do vírus da varíola, em vez de destruí-lo?

Esta é uma questão que vem sendo discutida pela Organização Mundial da Saúde ao longo de vários anos. Esse é um falso dilema. O vírus, nas condições em que é armazenado, não representa um perigo para a comunidade, pois muitas barreiras eficazes impedem o seu escape acidental. Por outro lado, é ilusória a ideia de que, ao destruir o último frasco contendo o vírus da varíola, o perigo representado por ele deixa de existir para sempre. Isso porque a estrutura do vírus é conhecida inclusive nas sequências do seu material genético que permitem recriar partículas virais infecciosas (tão letais quanto às isoladas da natureza) a partir da inoculação do material genético do vírus numa célula hospedeira, mesmo que este material genético seja sintetizado em laboratório a partir das sequências registradas em bancos de dados, em vez de ser isolado de um vírus encontrado em algum paciente.  

Portanto, destruir o vírus não acaba com o risco. Não destruir o vírus pode, paradoxalmente, permitir estudá-lo mais adiante, se necessário, para desenvolver novos tratamentos (antivirais) e para procurar outras formas de vacinação mais eficazes.

Podemos ter nova epidemia, em caso de acidente com o vírus?

Os locais onde estão armazenadas estas amostras possuem segurança máxima para amostras biológicas e o controle de acesso para pessoas autorizadas. Porém, caso ocorra uma exposição viral no ambiente, teoricamente este poderia contaminar a população não vacinada e se espalhar pelas cidades e países ao redor do acidente, causando doenças e mortes em grandes proporções.

No entanto, existem medidas que poderão ser seguidos para evitar a disseminação global da doença. Inicialmente, conter todos os pacientes infectados com o vírus, colocando-os em estado de quarentena, e ao mesmo tempo, vacinar a população das cidades ao redor do acidente, evitando que o vírus se espalhe.

A quarentena consiste em isolar os doentes em um ambiente separado de contato com a população em geral, não sendo esse isolamento prejudicial a eles, mesmo que sejam numerosos a ficar em quarentena no mesmo local, pois o contato com outros atingidos pela mesma infecção não é um fator agravante para o quadro deles. Essa providência evita que novas pessoas sejam infectadas. Para auxiliar no controle, os familiares dos doentes podem utilizar água fervente nas roupas usadas pelos infectados e evitar o contato direto com objetos que possam estar contaminados.

Já a vacinação em um curto espaço de tempo seria possível porque há, segundo a Organização Mundial de Saúde, meio milhão de vacinas contra a varíola ainda presentes no planeta. Se necessário, é possível produzir novos estoques de vacina para proteção em escala mundial porque o vírus vaccinia – a vacina originalmente usada para a erradicação da varíola - é facilmente obtido. O vírus vaccinia é utilizado em muitas aplicações científicas, graças ao seu poder imunizante (imunogenicidade), sua robustez (resistência à inativação no meio ambiente) e pela sua capacidade de receber novos genes por meio de técnicas de engenharia genética, o que possibilita o seu uso para vacinar contra outras doenças além da varíola.  

Portanto, apesar dos riscos de ocorrer acidentes capazes de causar a liberação de um vírus ou um patógeno perigoso para a população, existem ferramentas e protocolos capazes de solucionar o problema de forma a causar o menor dano possível. Esclarecer essas questões é de grande utilidade para preparar o público no caso de emergências epidemiológicas, e para evitar a disseminação de falsas informações, que levam ao pânico.

Referência:

Simonsen KA,Snowden J.Smallpox (Variola). StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2020.

Meyer H, Ehmann R, Smith GL. Smallpox in the Post-Eradication Era.Viruses. 24;12(2), 2020.

 Thèves C, Biagini P, Crubézy E. The rediscovery of smallpox. Clin Microbiol Infect. 20(3):210-8, 2014.

 

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